Anos a fio sem ir a Tavira. O regresso é na realidade uma descoberta, pois as memórias são já mera névoa. É uma cidade branca, com edifícios dotados dos seus típicos telhados de tesoura, à beira do rio Gilão, que acolhe os respectivos visitantes. Bem preservada, harmoniosa e acolhedora, espraia-se até ao mar, o qual não tinha fronteiras para os portugueses que fizeram a história da epopeia marítima.
Objecto de presença de fenícios, romanos e mouros, só no século XIII é conquistada pela Ordem de Santiago, sendo a expansão marítima dos séculos XV e XVI que lhe confere um status de relevância, de que são testemunha as várias edificações militares, civis e religiosas.
Uma urbe assim merece um hotel como o Hotel Ozadi que, alvo de recuperação em 2014, introduziu um novo conceito e um restaurante contemporâneo, mas manteve o edifício dos anos 70.
A simbiose entre novo e velho é equilibrada, elegante e charmosa, tendo a reabilitação merecido galardão. É a estrutura do restaurante que sobressai, parecendo uma proa ampla e envidraçada que flutua em frente à piscina. Em suma, um hotel com a cidade a seus pés.
É provavelmente, ainda, um facto pouco conhecido, que além de se poder visitar o Mosteiro de São Martinho de Tibães, também se pode lá dormir. Até o taxista que me trouxe de Braga até lá não o sabia. Mas comecemos pelo princípio.
Fundado nos finais do século XI, tornar-se-ia em 1567 a casa-mãe da Congregação de S. Bento de Portugal e do Brasil, elevando-o a um patamar de influência e importância ímpares. É neste contexto que o velho mosteiro românico é ofuscado e que extensas campanhas de reedificação e ampliação são empreendidas entre os séculos XVII e XVIII, imprimindo marcas maneiristas, barrocas e de rococó.
Com a extinção das ordens religiosas em Portugal, o mosteiro é encerrado em 1833/34 e os seus bens inventariados e vendidos. A este respeito importa referir que, à época, a biblioteca teria cerca de 26 mil a 28 mil volumes e que cerca de 60 anos antes o mosteiro havia pedido autorização para ter obras proibidas pelo Index. Embora nem todos os monges a elas tivessem acesso, pode-se dizer que a semente iluminista tinha condições para germinar.
Adquirido pelo Estado Português em 1986, vazio e em estado avançado de degradação, inicia-se a sua recuperação e preservação. As obras efetuadas até à data restituíram a este monumento todo seu esplendor e magnificência, dotando-o em 2009 de uma hospedaria e um restaurante geridos pelas freiras da Família Missionária Donum Dei. O projecto de arquitectura, da responsabilidade de José Carlos dos Santos, com linhas singelas e contemporâneas, fundiu-se no espaço e espírito deste local, disponibilizando 9 quartos (6 duplos e 3 singles).
É, pois, nesta atmosfera que se pernoita no Mosteiro de Tibães, num misto de silêncio, recolhimento e paz.